quarta-feira, 15 de julho de 2009

O Gato Preto (Parte II)

No dia seguinte ao do incêndio, visitei as ruínas. As paredes, com exceção de uma apenas, tinham desmoronado. Essa única exceção era constituída por um fino tabique interior, situado no meio da casa, junto ao qual se achava a cabeceira de minha cama. O reboco havia, aí, em grande parte, resistido à ação do fogo — coisa que atribuí ao fato de ter sido ele construído recentemente. Densa multidão se reunira em torno dessa parede, e muitas pessoas examinavam, com particular atenção e minuciosidade, uma parte dela, As palavras "estranho!", "singular!", bem como outras expressões semelhantes, despertaram-me a curiosidade. Aproximei-me e vi, como se gravada em baixo-relevo sobre a superfície branca, a figura de um gato gigantesco. A imagem era de uma exatidão verdadeiramente maravilhosa. Havia uma corda em tomo do pescoço do animal.
Logo que vi tal aparição — pois não poderia considerar aquilo como sendo outra coisa — , o assombro e terror que se me apoderaram foram extremos. Mas, finalmente, a reflexão veio em meu auxílio. O gato, lembrei-me, fora enforcado num jardim existente junto à casa. Aos gritos de alarma, o jardim fora imediatamente invadido pela multidão. Alguém deve ter retirado o animal da árvore, lançando-o, através de uma janela aberta, para dentro do meu quarto. Isso foi feito, provavelmente, com a intenção de despertar-me. A queda das outras paredes havia comprimido a vítima de minha crueldade no gesso recentemente colocado sobre a parede que permanecera de pé. A cal do muro, com as chamas e o amoníaco desprendido da carcaça, produzira a imagem tal qual eu agora a via.
Embora isso satisfizesse prontamente minha razão, não conseguia fazer o mesmo, de maneira completa, com minha consciência, pois o surpreendente fato que acabo de descrever não deixou de causar-me, apesar de tudo, profunda impressão. Durante meses, não pude livrar-me do fantasma do gato e, nesse espaço de tempo, nasceu em meu espírito uma espécie de sentimento que parecia remorso, embora não o fosse. Cheguei, mesmo, a lamentar a perda do animal e a procurar, nos sórdidos lugares que então freqüentava, outro bichano da mesma espécie e de aparência semelhante que pudesse substituí-lo.
Uma noite, em que me achava sentado, meio aturdido, num antro mais do que infame, tive a atenção despertada, subitamente, por um objeto negro que jazia no alto de um dos enormes barris, de genebra ou rum, que constituíam quase que o único mobiliário do recinto. Fazia já alguns minutos que olhava fixamente o alto do barril, e o que então me surpreendeu foi não ter visto antes o que havia sobre o mesmo. Aproximei-me e toquei-o com a mão. Era um gato preto, enorme — tão grande quanto Pluto — e que, sob todos os aspectos, salvo um, se assemelhava a ele. Pluto não tinha um único pêlo branco em todo o corpo — e o bichano que ali estava possuía uma mancha larga e branca, embora de forma indefinida, a cobrir-lhe quase toda a região do peito.
Ao acariciar-lhe o dorso, ergueu-se imediatamente, ronronando com força e esfregando-se em minha mão, como se a minha atenção lhe causasse prazer. Era, pois, o animal que eu procurava. Apressei-me em propor ao dono a sua aquisição, mas este não manifestou interesse algum pelo felino. Não o conhecia; jamais o vira antes.
Continuei a acariciá-lo e, quando me dispunha a voltar para casa, o animal demonstrou disposição de acompanhar-me. Permiti que o fizesse — detendo-me, de vez em quando, no caminho, para acariciá-lo. Ao chegar, sentiu-se imediatamente à vontade, como se pertencesse a casa, tomando-se, logo, um dos bichanos preferidos de minha mulher.
De minha parte, passei a sentir logo aversão por ele. Acontecia, pois, justamente o contrário do que eu esperava. Mas a verdade é que - não sei como nem por quê — seu evidente amor por mim me desgostava e aborrecia. Lentamente, tais sentimentos de desgosto e fastio se converteram no mais amargo ódio. Evitava o animal. Uma sensação de vergonha, bem como a lembrança da crueldade que praticara, impediam-me de maltratá-lo fisicamente. Durante algumas semanas, não lhe bati nem pratiquei contra ele qualquer violência; mas, aos poucos - muito gradativamente — , passei a sentir por ele inenarrável horror, fugindo, em silêncio, de sua odiosa presença, como se fugisse de uma peste.
Sem dúvida, o que aumentou o meu horror pelo animal foi a descoberta, na manhã do dia seguinte ao que o levei para casa, que, como Pluto, também havia sido privado de um dos olhos. Tal circunstância, porém, apenas contribuiu para que minha mulher sentisse por ele maior carinho, pois, como já disse, era dotada, em alto grau, dessa ternura de sentimentos que constituíra, em outros tempos, um de meus traços principais, bem como fonte de muitos de meus prazeres mais simples e puros.
No entanto, a preferência que o animal demonstrava pela minha pessoa parecia aumentar em razão direta da aversão que sentia por ele. Seguia-me os passos com uma pertinácia que dificilmente poderia fazer com que o leitor compreendesse. Sempre que me sentava, enrodilhava-se embaixo de minha cadeira, ou me saltava ao colo, cobrindo-me com suas odiosas carícias. Se me levantava para andar, metia-se-me entre as pemas e quase me derrubava, ou então, cravando suas longas e afiadas garras em minha roupa, subia por ela até o meu peito. Nessas ocasiões, embora tivesse ímpetos de matá-lo de um golpe, abstinha-me de fazê-lo devido, em parte, à lembrança de meu crime anterior, mas, sobretudo — apresso-me a confessá-lo — , pelo pavor extremo que o animal me despertava.
Esse pavor não era exatamente um pavor de mal físico e, contudo, não saberia defini-lo de outra maneira. Quase me envergonha confessar — sim, mesmo nesta cela de criminoso — , quase me envergonha confessar que o terror e o pânico que o animal me inspirava eram aumentados por uma das mais puras fantasias que se possa imaginar. Minha mulher, mais de uma vez, me chamara a atenção para o aspecto da mancha branca a que já me referi, e que constituía a única diferença visível entre aquele estranho animal e o outro, que eu enforcara. O leitor, decerto, se lembrará de que aquele sinal, embora grande, tinha, a princípio, uma forma bastante indefinida. Mas, lentamente, de maneira quase imperceptível — que a minha imaginação, durante muito tempo, lutou por rejeitar como fantasiosa —, adquirira, por fim, uma nitidez rigorosa de contornos. Era, agora, a imagem de um objeto cuja menção me faz tremer... E, sobretudo por isso, eu o encarava como a um monstro de horror e repugnância, do qual eu, se tivesse coragem, me teria livrado. Era agora, confesso, a imagem de uma coisa odiosa, abominável: a imagem da forca! Oh, lúgubre e terrível máquina de horror e de crime, de agonia e de morte!

13 comentários:

  1. ai sei lá isso acho que seja um pouco de superstição existe muita lenda emito sobre algumas coisas .. tipo Gato preto .. rsrs

    Abç

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  2. Oi! Eu li seu poema, ficou muito bom,adorei! Você também tem talento pra poesia. Parabéns!

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  3. Comecei a escrever sonetos não faz muito tempo, foi quando comprei um livro da Florbela Espanca ónde a maioria dos poemas é assim. Eu já conhecia essa forma de escrita mas nunca tinha tentado, então por influência desse livro acabei tentando. Você por acaso poderia me passar seu msn e/ou orkut, se quiser, para podemos conversamos melhor?. Gostei muito de conversar com você. Beijos.

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  4. muito bom e bem feito
    abrç

    www.celebritypoke.blogspot.com

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  5. iii, tou tristinha.
    Minha mãe quer proíbir meu namoro :/
    Eu contei ao meu namorado, ele se estressou e quase terminou o namoro comigo :S
    pra piorar, estou com as mãos formigando, e o rosto.
    Não sei o que é.
    Ontem fui dizer a minha mãe e tua acredita que ela gritou cmg???
    Enfim...
    minha vida ta um inferno.

    E a sua???

    Beijos
    Miss GG

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  6. aa pior que nem sei onde vendem aqeles pen drives u.u
    mas são muito fodas *-*

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  7. Caramba! OASIHAIHSIASIOSA' to esperando alguem descobrir teus contos , e até o dia de serem publicados ! HAHA' adoro

    se animar passa la
    http://confessominhanormalidade.blogspot.com/

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  8. me adiciona no msn: luckas_vampira@hotmail.com

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  9. Heeeeey ^-^
    Sophiaa e Ana curtiram a idéia, mas tipo, eu nunca escrevi um conto @-@'
    então num sei né ahuahuahua
    destruir blogs alheios, uii uiii... perversão! hahaha
    mas depois add a ana no msn
    cadaverica_girl@hotmail.com :D
    Beijãão ;*
    Ana e Sophia te aamam. Não suma! ♥

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  10. Oiiii
    Gostei muito dos seus textos.
    Tbm escrevo nesse estilo.
    Faz uma visitinha por lá
    http://quemcontaumconto1.blogspot.com/

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  11. Sinistro esse gato em camarada!
    Com certezao bicho é daqueles, pois ao que descreve a leitura alterou bastante o psicologico do protagonista a ponto de faze-lo matar a propria esposa.
    Continuo afirmando que escreve muito bem, a dramatização que relatou em palavras foi impecavel, fo impossivel não sentir bem os sentimentos que envolviam o personagem principal e seu torpor.

    Quanto ao que me questionou a respeito de como personalizar o blog, vamos do principio:
    HTML:
    o Html que compõe os elementos do blog é dividido, em seus elementos mais importantes, em duas partes.
    A primeira é o codigo em CSS, e na parte do cabeçalho(head), e depois tem a definição das camadas, os elementos da pagina no corpo(body).
    Traduzindo:
    No corpo tem as definições do que será exibido, por exemplo, um quadrado.
    No CSS será definido onde ele estara, de que cor vai ser, qual o tamanho, se terá imagem, e etc.
    Assim não mexa no corpo, foque apenas na parte do HEAD onde se encontra o CSS, pois será onde podera personalizar o blog com imagens.

    Desça vagarosamente o mouse nas linhas do html até encontrar o trecho:

    body {

    nesta linha poderá ser definido(sem contar que ja tem certas definições) sobre o corpo, a parte central do blog.
    Para colocar uma imagem aqui basta inserir na parte background: o seguinte codigo(sem as aspas) "url("endereço da imagem");
    background-repeat:no-repeat;"
    Se quiser fazer com a imagem do blog não repita basta colocar no- repeat como coloquei, caso queira colocar fixa coloque(sem aspas) "fixed" no lugar de no-repeat, ou "repeat-x" para definir só repetir horizontal, ou "repeat-y" para só vertical.

    Para definir imagem na barra lateral:

    #sidebar-wrapper {

    encontre esta parte, onde esta background, e repita o procedimento do corpo para definir a imagem.

    Há outro trecho para definir o fundo das postagens, porem não lembro qual é a parte, depois de digo.

    Para colocar musica, isso só com widget, ou gadget.
    Você pode montar sua própria seleção de musicas pela gadget de algum site que tenha como montar sua própria radio(tem varios blogs que tem musica, basta pegar o link que ta na radio), editar pelas opções que tem no proprio site, pegar o codigo, adicionar no blog uma nova gadget javascript, colar o codigo, e puxar depois a gadget para onde quer que seja exibida no blog.

    Espero ter ajudado, qualquer duvida me comunique.

    Um grande abraço, fica com Deus, parábens pelo blog.

    Ah sim! Caso queira optar pelo mesma radio que meu blog, o endereço para fazer sua radio é:
    http://www.radioblogclub.com/

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